A nova mesa de mistura
Estava a rever umas fotos antigas da rádio, que o José Lourenço me enviou quando reparei na mesa de mistura, que naquela altura era nova. Veio-me à memória o episódio da estreia oficial daquela mesa, que à semelhança de um barco quando vai ser largado pela primeira vez à água, teve direito a um brinde especial.
Naquela época, numa rádio que sobrevivia com muito pouco e com muita carolice, era com enorme dificuldade que se comprava equipamento novo, digamos que isso era praticamente impossível e o que acabava por acontecer era o aproveitamento de equipamentos antigos e peças usadas para refazer os existentes, era assim, que habilmente se mantinha operacional a rádio, com o ferro de soldar e muita capacidade de improvisar. Mas daquela vez tinha sido diferente, um esforço dos responsáveis, que naquela época era um trio composto pelo Sérgio Morgado, Capitão Azevedo e José Carvalheira, tinham tornado possível a compra de uma nova mesa de mistura, com inauguração cirugicamente prevista para o aniversário da rádio (sim porque equipamento novo era sempre estreado numa data importante), estávamos todos radiantes, por fim íamos conseguir por de lado a velha mesa, cujos potenciómetros já tinham sérias dificuldades em responder convenientemente.
Foi montada a mesa e preparada uma emissão especial, que reunia todos os colaboradores e responsáveis que se conseguissem aconchegar dentro do estúdio, 3 ou 4 pares de auscultadores serviam para fazer a monição e 2 microfones davam voz ao programa. Naquele dia o homem que ia estriar a mesa era o Bruno Silva, era ela que comandava as operações, da mesa saiam os vários cabos de auscultadores que desalinhados se cruzavam por cima da bancada até aos ditos, e como se tratava de um dia especial, uma emissão de aniversário, alguém se tinha lembrado de trazer umas latas de cerveja para o pessoal, e lá estávamos todos, reunidos, sentados em redor da nova mesa de mistura a emborcar umas cervejolas e a fazer um programa de entrevista em directo, em amena cavaqueira ao microfone, diga-se que a coisa até estava a correr bem. Foi nesse momento, quando nada parecia poder falhar que alguém puxou um dos auscultadores, o cabo esticou, uma lata de cerveja pousada no meio dos cabos tombou e o liquido sem aviso invadiu a nova mesa de mistura, entrando por tudo quanto era buraco, foi o pânico, o Bruno Silva deu um salto da cadeira e tirou as mãos da mesa com uma rapidez extraordinária com medo de um possível choque eléctrico, ficámos todos sem reacção, o Carvalheira foi direito ao botão e desligou a alimentação evitando que os estragos se alargassem.
A emissão ficou muda e nos rostos, a euforia de minutos antes transformou-se em frustração, foi realmente muito mau, escusado será dizer que novamente tivemos de usar a nossa capacidade de improvisar para resolver o problema, a mesa antiga tinha fichas diferentes o que dificultava a coisa, então fomos buscar uma mesa mais antiga, foi a primeira que a rádio teve e colocámos no ar a emissão, nos dias seguintes o Carvalheira desmontou a mesa nova peça por peça e secou tudo muito bem com um secador de cabelo, voltou a montar, lubrificou os potenciómetros tendo acabado por conseguir recuperar o equipamento, não a 100% mas dado o estrago sofrido digamos que não ficou nada mal.
A lição deste episódio foi : “se vai para o estúdio não beba”