Os Bonicos

Texto de CCarifas
Paio Mendes
Em tempos anteriores ao período de poluição que vivemos hoje, havia uma relação directa do homem com a natureza, de troca, sem agressões que molestassem uns e outros. A sobrevivência humana sempre se baseou na capacidade de descoberta de soluções para melhorar ou manter as suas condições para manutenção da vida. No mundo animal em que vivemos o engenho e a imaginação sempre foram vantagens acrescidas aos detentores de inteligência.
Pequenos passos foram dados ao longo de milhares de anos até se chegar ao presente estado de evolução, agora espartilhado em soluções mal concebidas, na sua relação com a natureza, que se transformaram em preocupações globais da humanidade.
Perguntar-me-ão. Afinal o que tem isto a ver com bonicos!
Antes do aparecimento dos adubos químicos e seus similares, que hoje infestam a natureza, o homem procurava já extrair da terra a sua semente multiplicada.
Em tempos longínquos, um lavrador semeou batatas no seu quintal. Reparou então que no local onde antes prendia o seu burro, as batatas eram maiores, melhores e em maior quantidade. Ao perguntar-se o porquê de tal circunstância, ficou com a suspeita que aquilo se deveria à mistura dos excrementos do burro com a terra. Engenhoso, partiu para a experiência na próxima sementeira, espalhando em todo o terreno os bonicos que entretanto juntara.
Eureca!!! Estava colhido o conhecimento para aumentar as suas produções.
A partir daqui criou-se o hábito da apanha dos bonicos, como fonte de energia orgânica, preciosa para a agricultura.
No meu tempo, nos anos 40 e 50 do século passado, ainda era vulgar ver crianças, depois do regresso da escola, irem de cesta no braço, a mando dos pais, percorrer os caminhos de passagem habitual de animais, para apanhar bonicos, que eram depositados em tulha, aguardando o tempo das sementeiras. Chegava a haver disputa dos “territórios” mais movimentados por bois, cavalos, mulas ou burros. Havia pais que criavam mesmo prémios de incentivo para as quantidades apanhadas. “Na próxima feira de Santa Iria compro-te um vestido de chita” ou, sendo rapaz, “quando passar cá o Espanhol, (contrabandista de roupas) compro-te uma Mitra (boina) ou um Realejo”.
Ccarifas
Paio Mendes


As viagens de manhã eram sempre mais calmas, talvez pela hora a que tínhamos de apanhar o autocarro, por volta das 7:00, ainda de noite no inverno. Apanhava o autocarro, normalmente acompanhado pelo meu irmão Sérgio que na altura estudava também na mesma escola, era no autocarro que vinha da Sertã que iniciávamos a jornada até Tomar. A correria começava logo de manhã, o acordar às 6 e picos nem sempre era fácil, quando saíamos lá do fundo das Courelas por vezes conseguíamos ouvir o autocarro a passar no Cabeço do Boi, o que invariavelmente fazia com que o percurso até às Besteiras tivesse de ser feito sempre de passo bem acelerado... a correr para ser mais preciso.
